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China reforma ministérios para fortalecer proteção ambiental

Dois novos ministérios para gerenciar recursos naturais e combater poluição
<p>(imagem: <a href="https://www.flickr.com/photos/isi1ent/10603462723/in/photolist-h9Zw3P-6FYHtU-4mWXxV-6FUjmF-6FUwmv-6FYqZu-6FUAjX-6FYJyY-5GphsG-6FYNNy-6FUGf6-6FUiyX-cixhNb-drAtgT-HMdLh-drAzMb-drAqxB-XB2z3c-7tWCj9-k4Fq3q-7afMf-drAEHC-drAqqZ-6AEPHZ-drAAV7-p6fD1-p6fDm-4Hm9sd-drAqgg-AELX-4LdXjB-VZQeDe-drAqaV-fwQNa-67mq1Y-drAzSo-6s6daD-KZZ3Gg-drAqNp-PxRXCw-EBHtE6-JEfqNf-JEfqPs-MVRSpi-eX8bqZ-fwQE6-DWFra-DWFrf-d75dDQ-7dDcty">Danny Pang</a>)</p>

(imagem: Danny Pang)

“Nós cuidamos do monóxido de carbono, enquanto o dióxido de carbono é responsabilidade da Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma”, foi o comentário frustrado de Zhou Shengxian, então ministro do meio ambiente da China, em uma conferência realizada em 2013.

No entanto, essa fragmentação burocrática logo se tornará coisa do passado, depois que um extenso plano de reforma ministerial no país – anunciado na semana passada durante a reunião anual do Congresso Nacional do Povo (CNP) – foi aprovado em 17 de março.

Antes das mudanças, a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma (CNDR) era responsável pelo gerenciamento de gases do efeito estufa e combate às mudanças climáticas. No entanto, esses deveres, juntamente com as funções ambientais de diversos outros ministérios, serão repassados para um novo Ministério do Meio Ambiente Ecológico.

Com essa manobra, é a quarta vez em três décadas – uma a cada 10 anos – que a agência ambiental da China (atualmente chamada de Ministério da Proteção Ambiental) verá a sua área de responsabilidade se ampliar em um novo departamento, destacando a crescente importância das questões ambientais na elaboração das políticas chinesas.

De ‘nove dragões’ para dois

Na China, há muito tempo se usa a expressão “nove dragões reinam sobre as águas” (jiu long zhi shui), referindo-se à fragmentação de funções e responsabilidades no gerenciamento do meio ambiente.

Ma Jun, um proeminente ambientalista e diretor do Instituto de Assuntos Públicos e do Meio Ambiente, observou que “o gerenciamento de águas subterrâneas, efluentes agrícolas e bacias hidrográficas recaem, cada um, sobre um diferente departamento governamental, gerando negação de responsabilidades e brigas internas.”

Tang Fanglin, oficial da Administração Florestal Nacional, disse ao chinadialogue que “era preciso obter carimbos de 13 ministérios governamentais para conseguir aprovar um documento sobre esquemas-piloto para parques nacionais.”

Tudo isso deve mudar, no entanto. O novo plano concentrará as responsabilidades dispersas dos diversos departamentos governamentais em dois novos ministérios: o Ministério do Meio Ambiente Ecológico (MMAE) e o Ministério dos Recursos Naturais (MRN).

O MMAE assumirá a maior parte das responsabilidades do Ministério de Proteção Ambiental e deverá incorporar as funções relativas à poluição antes detidas pelo CNDR, Ministério de Recursos Hídricos e pela Administração Nacional dos Oceanos, entre outros.

O MRN, por outro lado, deverá aglutinar as responsabilidades de gerenciamento de recursos naturais antes atribuídas aos órgãos governamentais responsáveis por florestas, agricultura, recursos fundiários, etc. No processo, alguns departamentos existentes, como a Administração Nacional de Oceanos, serão eliminados, enquanto outros, como o Ministério de Recursos Hídricos, terão suas responsabilidades reduzidas.

De maneira geral, a reforma se alinha com recomendações já dadas pelos principais centros de análises chineses. Em 2015, a Academia Chinesa de Ciências sugeriu uma reorganização dos principais órgãos governamentais em um “proprietário dos recursos naturais”, um “administrador dos recursos naturais” e um “controlador de poluição”. O MRN surgiu para funcionar mais ou menos como um proprietário e administrador dos recursos naturais, enquanto o MMAE servirá como o maior regulador nacional de poluição, de todas as fontes.

Os especialistas têm comemorado a manobra, dizendo que ela aumentará a eficiência da burocracia. “Isso vai definitivamente diminuir o custo de coordenação entre agências governamentais”, afirmou o professor Li Zhiqing, economista ambiental na Universidade Fudan.

A eliminação da barreira regulatória que existia entre os gases do efeito estufa e outros poluentes tem sido interpretada como um sinal de que ações mais rigorosas sobre as emissões de carbono podem estar a caminho.

Peng Peng, analista da Associação Chinesa da Indústria de Energia Renovável, argumentou que, quando o MMAE assumir a responsabilidade sobre todas as emissões, “é quase inevitável que as empresas enfrentarão a possibilidade de internalizar os custos das emissões de gases do efeito estufa”, pois a agência ambiental tem um longo histórico e ferramentas prontamente disponíveis para regular empresas emissoras.

Ecocivilização formalizada

A reorganização em nível ministerial também é vista como um avanço por conta do conceito amplamente discutido da “Civilização Ecológica”. Em 2012, no 18º Congresso do Partido, a necessidade de se construir uma ecocivilização foi elevada a um nível sem precedentes, destacando a importância das questões ambientais para os líderes chineses.

Em 2015, foi promulgado um plano diretor de reformas de instituições e sistemas para concretizar a Ecocivilização. O plano listou um conjunto de princípios e objetivos e anunciou que, até 2020, a China deveria “concluir a configuração institucional em linha com a Ecocivilização”.

“O estabelecimento dos novos ministérios é um dos passos mais concretos na trajetória de implantação do plano diretor”, Peng Yingdeng, ex-diretor do Instituto de Pesquisas Ambientais Atmosféricas, sediado em Pequim, disse ao chinadialogue. “Ele estabelece a base para a criação de peças principais de políticas do governo, como os esquemas de pagamento por serviços ecológicos”, acrescentou.

O plano diretor de 2015 descreveu alguns conceitos-chave da Ecocivilização. O documento argumenta que “os recursos naturais devem ser devidamente valorizados” e “holisticamente administrados”. O plano também estipula que as atividades econômicas não devem gerar ônus ecológicos que excedam a capacidade suportada pelo meio ambiente.

A configuração dos dois novos ministérios incorpora esses conceitos. Uma das funções centrais do MRN é servir como “proprietário” da maioria dos recursos naturais do país. Para isso, ele realizará censos e levantamentos para determinar a situação e distribuição de florestas, áreas úmidas e campos agrícolas, atribuindo valores apropriados a esses recursos.

“O valor não econômico dos recursos naturais é cronicamente subvalorizado, o que leva a um excesso de exploração e desperdício”, escreveram Gu Shuzhong e Li Weiming, dois pesquisadores do Centro de Pesquisas para o Desenvolvimento, do Conselho do Estado, em 2016. Eles acrescentaram: “Estabelecer a devida propriedade e o valor dos recursos naturais serão essenciais nas reformas para a Ecocivilização.”

O MRN também se tornará o principal “planejador espacial” do país, incorporando as considerações ecológicas. “Ao invés de ter várias agências desenhando as chamadas Linhas Vermelhas Ecológicas (planos de zoneamento que proíbem empreendimentos em determinadas áreas), o MRN passará a atuar como único planejador”, disse Peng Yingdeng, significando que “não haverá mais planos de zoneamento contraditórios, que precisem considerar imperativos conflitantes”.

Tanto o MRN quanto o MMAE refletem a ideia de “administração holística”, reduzindo a fragmentação das responsabilidades regulatórias.

Como observado por Peng Kui, coordenador de projetos do Instituto Ambiental Global (GEI), “no passado, os projetos de reabilitação ecológica eram vitimados pela concorrência entre os administradores de florestas e de campos. Os primeiros insistiam em plantar árvores como forma de reabilitação, enquanto os segundos preferiam as gramíneas, pois essas decisões determinavam as verbas que as respectivas agências receberiam. Com a fusão, podemos finalmente basear essas decisões em considerações holísticas, ecológicas.”

Questões não resolvidas

Ainda assim, há algumas segmentações regulatórias intocadas pela reorganização. O plano divulgado na terça-feira, sobre os dois ministérios, não inclui uma recomendação da Academia Chinesa de Ciências que indica uma fusão ainda maior entre as áreas de controle de poluição e conservação ambiental, criando um “mega ecoministério” que enxugaria ainda mais os processos de governança ambiental do país. Sob a nova estrutura, as autoridades responsáveis pelas decisões de zoneamento ecológico podem ainda precisar acionar outros ministérios para conseguir a cooperação na regulação de emissões.

“É inevitável haver algum nível de coordenação interministerial”, disse Tang Fanglin ao chinadialogue. “Se um parque nacional estiver futuramente ameaçado pela poluição do ar, o MRN certamente precisará negociar com o MMAE.”

O relacionamento entre o governo central e as autoridades provinciais e locais também poderá ser um teste para a nova configuração institucional. Há muito tempo, os especialistas argumentam que a dinâmica entre o governo central chinês e as autoridades de esfera provincial e local é uma das principais complicações de uma nova estrutura de governança ambiental.

“Em alguns casos, o órgão central, como ‘proprietário’ nominal dos recursos naturais, não tem o controle de fato deles no nível provincial ou local, o que permite que as autoridades locais desperdicem esses recursos em busca de lucro”, escreveram Gu e Li, acrescentando: “Em outros casos, a administração dos recursos locais vem com muitas responsabilidades, mas poucos benefícios são retidos pelos governos locais, o que desincentiva as práticas rigorosas de governança.”

O plano de reorganização, por se dar em nível ministerial, não responde imediatamente às dúvidas sobre o alinhamento entre o governo central e as autoridades locais. “Nós ainda não sabemos se a reestruturação em nível ministerial será refletida no nível local”, disse Peng Kui ao chinadialogue.

Projetos piloto provinciais deverão ajudar a direcionar os próximos passos. Por exemplo, na província de Zhejiang, um esquema de “propriedade escalonada” foi elaborado para avaliar e alocar a propriedade dos recursos naturais aos diferentes níveis de governo, desde o provincial até o distrital ou municipal, com base em sua significância ecológica. Esse processo de balanceamento pode incentivar uma melhor governança, pois permite que o proprietário oficial do recurso também retenha os benefícios do seu gerenciamento, ao invés de cedê-los a uma autoridade superior.

Outra parte do plano que ainda requer detalhamento é como as funções e responsabilidades específicas serão integradas aos novos ministérios. O tema das mudanças climáticas, por exemplo, abrange diversos órgãos subministeriais vinculados ao CNDR, inclusive órgãos divisionais e centros de pesquisa dedicados. Não está claro se – e quando – essas unidades do CNDR serão transferidas para o MMAE.

Esta matéria foi originalmente publicada pelo chinadialogue.net

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