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CCCC expande portfólio na América Latina

Empresa chinesa já é responsável por mais de 50 obras por toda a América Latina, mas seu passado preocupa
<p>O primeiro-ministro jamaicano, Andrew Holness, e o embaixador chinês na Jamaica, Niu Qingbao, em cerimônia de inaguração da Estrada Norte-Sul, em Caymanas, na Jamaica, em 2016 (imagem: Alamy)</p>

O primeiro-ministro jamaicano, Andrew Holness, e o embaixador chinês na Jamaica, Niu Qingbao, em cerimônia de inaguração da Estrada Norte-Sul, em Caymanas, na Jamaica, em 2016 (imagem: Alamy)

Em 2014, a empreiteira brasileira Odebrecht parecia pronta para tomar o mundo. Com obras em 21 países, tinha um faturamento de 46 bilhões de dólares — raspando nos 55 bilhões faturados por sua competidora chinesa, a estatal China Communications Construction Company, CCCC, que iniciara há alguns anos sua expansão no América Latina.

Mas naquele ano, uma colossal investigação transfronteiriça, a Lava Jato, desembaraçaria as teias de corrupção que sustentavam o reino da Odebrecht, e as atividades, assim como a reputação, da empresa passariam a encolher.

10 dos maiores projetos da CCCC na América Latina

  • Quarta ponte sobre o Canal do Panamá (Panamá) - US$1,5 bilhão
  • Porto Sul (Brasil) - US$580 milhões
  • Ferrovia Pará (Brasil) - US$1,6 bilhão
  • Metrô de Bogotá (Colômbia) - US$4,5 bilhão
  • Expansão do aeroporto internacional (Guiana) - US$150 milhões
  • Estrada Norte-Sul (Jamaica) - US$730 milhões
  • Renovação Porto de Santiago (Cuba) - US$120 milhões
  • Canal do aeroporto (Equador) - US$520 milhões
  • Estrada San Borja Highway (Bolívia) - US$245 milhões
  • Trem Maya (México) - US$630 milhões

Sua competidora, no entanto, seguiu em frente. E, agora, com um faturamento de quase 90 bilhões de dólares já toca mais de 50 obras em pelo menos 19 países da América Latina e Caribe, segundo um levantamento do Diálogo Chino em sites da empresa e suas mais de 30 subsidiárias.

O motivo da expansão, para Charles Tang, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China, é simples: “Há poucos anos, na pior fase da crise econômica do Brasil, quem acreditou e apostou no Brasil foram os chineses”.

A fé — não só no Brasil, mas em toda a região — tem se traduzido em faturamento extraordinário. A CCCC hoje abocanha alguns dos principais projetos de infraestrutura da região: o metrô de Bogotá, o Trem Maya do México, o Porto de São Luís no Brasil, a expansão do aeroporto internacional da Guiana, a Estrada Norte-Sul da Jamaica, e uma ponte no Canal do Panamá, entre dezenas de outros.

Mas não só a fé e a Lava Jato explicam a expansão de empresas chinesas na América Latina, segundo Hsia Hua Sheng, especialista em Finanças Corporativas Internacionais da Fundação Getúlio Vargas.

Importa também o bolso. A estatal tem acesso a grandes volumes de capital. Várias obras lideradas pela gigante chinesa têm também investimento de bancos do país. O Porto São Luís, por exemplo, foi beneficiado por um financiamento de 700 milhões de dólares do Banco Comercial e Industrial da China. Muitas outras são parte da Iniciativa do Cinturão e Rota.

“As pequenas e médias construtoras brasileiras têm mais dificuldade,” explica Sheng. “Falta capital.”

Os precedentes do CCC preocupam a América Latina

Depois de tantos escândalos de corrupção, a nova gigante do setor causa temores por seu próprio histórico de irregularidades. Afinal, a estatal chinesa se envolveu em diversos casos de corrupção ao redor do mundo.

Em 2009, entrou para a lista negra do Banco Mundial por fraudar uma licitação nas Filipinas. Depois, se envolveu em suspeita de corrupção em ferrovia na Malásia, e foi investigada na Austrália por causa da construção de um hospital infantil. Em Bangladesh, uma de suas subsidiárias, a China Harbour Engineering, foi acusada por integrantes do governo de oferecer propina. Acusações de corrupção também foram frequentes na construção de um porto na Tanzânia.

Na América Latina, apesar de não haver escândalos vultosos, também há sinais de irregularidades.

Em São Luís, onde a empresa constrói um enorme porto, promotores locais investigam se a empresa se aproveitou de um esquema de grilagem. No Panamá, autoridades locais encontraram irregularidades no contrato para construir uma ponte. Contratos também foram um problema na obra de uma universidade no Equador.

O que importa é que as pessoas físicas que se envolveram em problemas no passado não estejam envolvidas diretamente

Outro sinal de alerta ocorreu em 2016, quando a CCCC comprou a empresa brasileira Concremat, uma construtora com sede no Rio de Janeiro que não escapou da Lava Jato. Alguns executivos foram denunciados em esquemas de corrupção ligados à investigação.

Os efeitos foram notórios: em 2012, a Concremat contava com 9 mil colaboradores; em 2016, depois de passar pelos escândalos de corrupção e pela queda de uma ciclovia no Rio de Janeiro, a Concremat tinha apenas um terço, ou 3 mil colaboradores.

O advogado criminalista Pierpaolo Bottini, que defendeu vários executivos de companhias brasileiras que foram alvo da Lava Jato, alerta que irregularidades passadas não necessariamente pautam o futuro de uma empresa

“O que importa é que ela tenha mecanismo de compliance estruturado e que aquelas práticas não façam parte do presente”, diz

A CCCC também encontra um ambiente regulatório muito mais preparado para vigiar e punir eventuais irregularidades, diz Bottini. Os órgãos de investigação, segundo ele, já usam mais tecnologia para investigar empresas, o que as forçou a incorporar sistemas de controles internos para evitar desvios de conduta.

“O que importa é que as pessoas físicas que se envolveram em problemas no passado não estejam envolvidas diretamente [na administração]. Ou, se estiverem, que já tenham cumprido sua pena”, acrescenta o advogado.

Crescimento em tempos de crise

Yu Yanhua, CEO da Shanghai Dredging Company, uma das subsidiárias da CCCC ainda se lembra quando sua empresa trabalhava apenas com navios alugados, quando iniciou sua atuação no Brasil, em 1999.

Segundo contou em uma entrevista à Xinhua no ano passado, ele divide a atuação da empresa em três fases. Aquele inicial, a fase entre 2002 e 2018, em que a empresa de expandiu e cresceu no Brasil, e a posterior, após a aquisição de uma empresa brasileira.

“Espero que possamos ter mais êxito e um mercado ainda maior,” ele contou.

 A exaltação de Yu reflete os privilégios de uma empresa com capital em uma região repleta de países que enfrentam difíceis crises.  Só no Brasil, a empresa diz estar de olho em 26 projetos.

Segundo o presidente executivo da Concremat, Mauro Viegas Neto disse ao jornal Valor Econômico, o objetivo da companhia era atuar em projetos feitos por meio de parcerias público-privadas. O foco, afirmou, com foco, seria logística de carga, como portos, pontes e ferrovias, “onde o conhecimento do grupo na China é um diferencial”.

Enquanto isso, o governo brasileiro só faz apertar os cintos.  A diretriz do atual ministro da Economia brasileiro, Paulo Guedes, mira em mudanças regulatórias que possam estimular investimentos privados em áreas-chave na infraestrutura, como em energia, saneamento e logística por meio de parcerias com o poder público.

A crise parece uma oportunidade para os chineses, segundo explica Charles Tang:

“O Brasil vai depender muito dos investimentos chineses para a construção da infraestrutura necessária”.

A CCCC não respondeu a pedidos de entrevista do Diálogo Chino.