Poluição

Novo ministro do meio ambiente chinês enfrentará grandes desafios

Ministro não tem experiência política, mas é um respeitado acadêmico

A nomeação do reitor da universidade mais respeitada da China para o cargo de ministro foi inesperada. No país, é rara a indicação de acadêmicos sem histórico de participação no governo. No entanto, a medida faz sentido frente à reputação manchada do ministério ambiental chinês, cuja atuação, na opinião de muitos, tem sido um fracasso.

A nomeação de Chen Jining, reitor da Universidade Tsinghua, como novo Ministro da Proteção Ambiental teve também outro aspecto pouco usual: foi anunciada sem quase nenhuma menção a seu predecessor, Zhou Shengxian, de 65 anos, titular do cargo durante uma década.

Este afastamento das convenções é menos surpreendente do que pode parecer. Os desastres ambientais que ocorreram durante o mandato de Zhou foram largamente noticiados e tornaram-se uma fonte crescente de descontentamento público e desconforto para as lideranças do Partido Comunista.

Críticas públicas

Foram muitas as críticas ao Ministério de Proteção Ambiental (MPA), manifestadas por diversos grupos durante a assembleia anual do Congresso Nacional do Povo (CNP), muitas vezes chamado pela mídia ocidental de “parlamento do carimbo” — ou seja, um órgão de fachada, que não gera controvérsias. Também houve críticas durante a sessão paralela da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês (CCPPC). Este tipo de repreensão pública é extremamente rara.

Ainda por cima, aconteceu em dois anos seguidos. Em março de 2013, a votação das nomeações para o Comitê de Proteção Ambiental e Recursos Naturais registrou 850 votos contra, 120 abstenções e 1.969 a favor. O resultado gerou espanto e desencadeou aplausos dos delegados.

Em 2014, eles haviam solicitado ao MPA um relatório anual a ser entregue ao CNP e CCPPC, para votação.

Estes eventos colocaram em destaque não apenas a profundidade da crise da poluição da China, mas também o fato de que a aceitação pública dos problemas ambientais já chegou em seu limite. Este nível de discordância nunca foi visto antes, mesmo contra outros alvos de insatisfação pública, como os preços de imóveis, saúde e educação.

Reserva de talentos

Após estes acontecimentos, a alteração na liderança do ministério não foi surpresa. Mas por que Chen Jining foi o escolhido?

Apesar de seus conhecimentos profissionais e técnicos, pode ser mais relevante mencionar um relacionamento pessoal. Chen Xi, diretor assistente do Departamento de Organização do Partido, órgão de grande influência e que supervisiona as nomeações, foi o secretário do Partido na Universidade Tsinghua entre 2002 e 2009. Ele também é graduado em química na mesma instituição, tendo estudado lá entre 1975 e 1979.

Xi Jinping foi aluno do mesmo curso durante os mesmos cinco anos. É possível que vejamos novas “estrelas ascendentes” com diplomas da Universidade Tsinghua.

Dilemas no alto escalão

Chen tem apenas algumas semanas para se preparar antes de assumir seu novo papel, após a assembleia do CNP em março. Ele enfrentará enormes desafios, como encontrar uma maneira de transformar as prioridades de ‘crescimento sustentável’ do governo em reais melhorias à péssima qualidade do ar, do solo e da água na China.

Em entrevista ao jornal pequinês  ‘The Paper’, o professor Wang Zhansheng, da Faculdade de Ciência e Engenharia Ambiental, que deu aulas a Chen, disse esperar que seu antigo aluno seja capaz de alinhar diversos grupos de interesses e manter-se firme face à pressão.

Apesar de seu histórico acadêmico, Chen possui experiência prática tanto na resolução de variados problemas ambientais quanto no trato com ministérios do governo e na promoção de novas soluções de negócios.

“Prático e sensato”

De acordo com Wang Yong, antigo colega de turma no Imperial College, em Londres, Chen “esteve envolvido em diversas áreas diferentes e em avaliações estratégicas de impacto ambiental. Ele tem uma boa compreensão geral do meio ambiente chinês. Não é como muitos acadêmicos, focados em uma única tecnologia.”

Em relação a muitos outros acadêmicos, Chen pode ser mais qualificado. Apesar de sua falta de experiência de governo, ele possui extensas redes de contatos profissionais e técnicos.

Ele é membro da Comissão Consultiva Ambiental Nacional, vice-presidente do Comitê de Ciência e Tecnologia do MPA e vice-presidente da Sociedade Chinesa de Ciências Ambientais.

De acordo com Qu Geping, primeiro chefe da Agência Chinesa de Proteção Ambiental, Chen possui muitas das qualidades certas para liderar a MPA. Ele o descreve como um homem “prático e sensato” que “leva em consideração os fatos da questão”, “não faz discursos grandiosos e sem conteúdo” e tem “uma atitude científica.”

Mesmo assim, sua nomeação implica alguns riscos. Chen é um novato na política, com pouca experiência em cargos governamentais que não aqueles que deteve na Universidade Tsinghua, onde foi reitor por menos de três anos. Lá, era frequentemente visto no campus, de pé ao lado de sua bicicleta, batendo papo com outros professores. Porém, no ministério, a vida será menos tranquila.

Batalhas políticas serão rotina em seu novo trabalho, no qual ele deverá harmonizar complexas redes de interesses e relacionamentos entre governos locais, outros ministérios e grandes empresas estatais.

China quer oficiais com reputação limpa

No entanto, no caso de Chen, a falta de experiência de governo poderá ser vantajosa em meio à cruzada contra a corrupção que está em curso no país, pela primeira vez, desde a fundação da República Popular.

Entre o 18º Congresso do Partido em 2012 e o final do ano passado, 55 oficiais provinciais e ministeriais foram pegos na devassa anticorrupção. Em média, dois oficiais têm sido colocados sob investigação a cada mês.

Agora, a principal preocupação das lideranças atuais é reconstruir a estrutura política da China — mas trata-se de tarefa complicada, pois muitos dos potenciais candidatos estão vinculados aos oficiais sob suspeita. Com isto, cria-se um dilema para os responsáveis por preencher — ou desocupar — os mais altos cargos.

Nas últimas duas décadas, vários reitores de universidades foram promovidos a cargos de alto escalão no governo chinês. Zhou Ji era reitor da Unidade Huazhong de Ciência e Tecnologia quando foi promovido a Ministro da Educação.

Ainda menos usual foi a nomeação de dois ministros provindos de fora do Partido Comunista, selecionados por conta de suas extensas habilidades tecnocráticas. Wan Gang, Ministro da Ciência e Tecnologia, é ex-reitor da Universidade Tongji e já trabalhou para a montadora automobilística alemã Audi. O Ministro da Saúde chinês — um cargo delicado — é o pesquisador de células tronco e hematologista de renome internacional Chen Zhu.

Chen assume o novo cargo em meio a grandes desafios, enquanto a China tenta debelar uma grave crise ambiental.