Clima & energia

El Niño passou, mas as vítimas precisam de ajuda

Combinado com mudança climática está criando impactos sem precedentes

Mais de 400 milhões de pessoas sofreram impactos do evento climático El Niño, que terminou em meados deste ano. As secas resultantes do fenômeno continuam a afetar os agricultores de todo o mundo, diz um relatório da ONG ActionAid. Os países em desenvolvimento e as agências humanitárias precisam urgentemente de dinheiro para ações de emergência e para ajudar os agricultores a se recuperar. Mas há uma indiferença generalizada e o montante disponível está muito aquém do necessário estimado – um déficit de US$ 3,1 bilhões.

Ao divulgar o relatório na Conferência do Clima das Nações Unidas (COP22), que acontece de 7 a 18 de novembro em Marrakech, no Marrocos, Teresa Anderson, consultora de clima da ActionAid, disse que “esta pode ser a maior seca jamais ocorrida no mundo”. O evento afetou grandes zonas da Ásia, África, Américas do Norte e do Sul.

O El Niño é um fenômeno climático que inicia no Oceano Pacífico e afeta os padrões de chuvas, tendo causado muitas secas e inundações no passado. Mas houve algo novo durante El Niño deste ano. Os cientistas autores do relatório concluíram que ele causou efeitos muito mais graves devido ao recorde de altas temperaturas, resultado das mudanças climáticas.

A Organização Meteorológica Mundial informou que 2016 está a caminho de tornar-se o ano mais quente da era moderna – um recorde que vem sendo quebrado quase todos os anos neste milênio. Além das secas em todo o planeta, também causou crises extremas de abastecimento de água na Índia neste verão.

O relatório, chamado “Planeta mais quente, crise humanitária”, afirma que mais de 400 milhões de pessoas foram afetadas por essa combinação El Niño com os impactos das mudanças climáticas, e os pequenos agricultores continuam sendo atingidos. A maioria perdeu suas economias e não poderá plantar sua safra na próxima temporada. Eles precisam de ajuda financeira urgente, de treinamento e ensinamento para adotar outras culturas e técnicas agrícolas mais resistentes em um mundo mais quente, com mais inundações e mais secas, diz o relatório.

Cientistas agrícolas indianos e muitas organizações internacionais já desenvolveram variedades de culturas com essas características de resistência, mas há uma grande falta de comunicação que está impedindo muitos agricultores de aproveitar esses novos conhecimentos.

A retórica e a resposta

A ActionAid diz que há uma grande defasagem entre a retórica do clima e a resposta aos desastres. Teresa Anderson diz que “é chocante que no ano que se seguiu ao Acordo de Paris sobre mudança climática, o mundo tenha ficado basicamente em silêncio sobre essa emergência climática global, uma das maiores já ocorridas”. Ela ressaltou que países tão distantes uns dos outros como África do Sul, Etiópia, Brasil e Vietnã sofreram sua pior seca em décadas, e tiveram que declarar emergência nacional. Muitos estados da Índia e dos Estados Unidos também declararam emergência este ano pela mesma razão.

O relatório diz que os cientistas acreditam que esses impactos estão sendo causados pela combinação da mudança climática com El Niño, e que a mudança climática intensificou os efeitos do El Niño. Mas muitos cientistas creem que, mesmo sem El Niño, 2015 teria sido o ano mais quente jamais registrado.

Impactos sociais

O relatório detalha os impactos sociais dessas secas. Para Anderson, “as mulheres e as crianças estão sendo as mais atingidas. As mulheres estão deixando de fazer refeições e caminhando horas e horas todos os dias para encontrar água. As meninas estão saindo da escola e os casamentos de crianças estão aumentando. Em alguns países as mulheres estão recorrendo ao trabalho sexual para poder alimentar a família”.

Ela ressaltou que, apesar dessas crises, os países em desenvolvimento e as agências humanitárias enfrentam uma defasagem de US$ 3,1 bilhões para atender às necessidades dos que continuam afetados. “Os governos que prometeram compaixão climática em Paris aparentemente deram as costas a uma crise climática real de alcance global”.

Além de suprir esse déficit imediato de financiamento, a ActionAid apela à comunidade internacional para que forneça sua parcela de financiamento climático para apoiar a capacitação e as estratégias de adaptação ao clima. Os países ricos devem comprometer quantias muito mais elevadas para ações imediatas, e os países vulneráveis devem melhorar o planejamento e a identificação do limiar para ações iniciais em desastres de início lento, como secas, disse a organização.

A ActionAid afirmou ainda que é preciso fortalecer a colaboração entre os organismos climáticos, humanitários e de desenvolvimento. Julga também que a obrigação moral dos países de prestar apoio humanitário deve ser reforçada pela sua responsabilidade histórica de serem causadores da mudança climática.

Essa matéria foi primeiramente publicada pelo India Climate Dialogue